quinta-feira, fevereiro 14, 2008

Manifesto da Brincadeira Comunista

Quando os vi, lembrei da minha infância. Vários garotos num final de tarde em suas sujas chuteiras desamarradas. Na roda que se formava na calçada próxima ao novo mercado, garrafas pet passavam de mão em mão enquanto as embalagens tamanho família de vários sabores de salgadinho protagonizavam o café da tarde. As risadas isoladas rompiam até mesmo a tensão contínua dos motores que ignoravam aquele momento ao qual todos deveriam retroceder.

Quando era pequeno, numa turma que nunca passava de meia dúzia de garotos, costumava me divertir de maneira parecida. Depois do esconde-esconde e do polícia e ladrão(futebol era proibido no prédio), embarcávamos em nossa caça ao tesouro.

Subíamos e buscávamos barbante e imãs. Uníamos os dois por vários nós amadores e desnecessários para buscar pelas calhas e bueiros do condomínio onde moramos, as esquecidas moedas que não valiam similar esforço de seus ex-donos. Exigia paciência e atenção, mas era sempre a parte mais divertida da brincadeira. Cada moeda, do menor valor que fosse, era comemorada e adicionada a um saquinho de supermercado como um dobrão conquistado por Robin Hood. Na época, todas as moedas eram feitas de aço inoxidável, portanto, nenhuma escapava ao poderoso imã de geladeira!

Depois de nos cansarmos ou percorrermos pelo menos duas vezes todos as possíveis minas do condomínio, fazíamos a contagem(errada, é claro) da nossa fortuna. Acho que nunca chegamos a dois digitos inteiros... Era sempre o suficiente. Jamais entenderia naqueles dias que era graças a entrega irresponsável das nossas riquezas ao capital privado e estrangeiro que o Kinder Ovo custava 1 real. Mais tarde eu entenderia e condenaria o neoliberalismo, mesmo sabendo que poderia encontrar meu chocolate em qualquer bueiro...

Corríamos à quitanda da rua da frente e fazíamos nossas compras. O salgadinho embalagem tamanho família, os refrigerantes e, com sorte, um Kinder Ovo pra cada um. Era o mais saboroso lanche de vários dias. Não podíamos tê-lo sempre... As pessoas não perdem tantas moedas assim! O imã e o barbante seriam guardados pra posterior aventura.

Quem nunca ouviu dizer ou até admitiu que são as crianças a voz sincera da justiça? As moedas não faziam falta a seus donos... Caso fizessem, eles a pegariam. Nada mais justo que pegar o capital excedente, e alocar entre aqueles que não tem sua riqueza social garantida. Quando é que nos esquecemos disso?

Ler escutando Chico Buarque - João e Maria

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sexta-feira, fevereiro 08, 2008

Meus caminhos

Era a primeira vez que fazíamos isso juntos. Ela não estivera no comando antes. Eu conhecia bem cada próximo passo. O relógio fugia ainda sem sucesso da penumbra daquela noite, um palco perfeito. Minha voz amorosamente atenta e calma foi o suficiente para guiá-la por aquela nova experiência.

O nervosismo era evidente: De uma lado meu zelo dispensado à ela pra que se sentisse o mais confortável possível, do outro, o medo de fazer algo de errado enrigecia todos os músculos. Cada ponto por que passávamos tornava-se uma memória, memória esta, que percorreríamos mais vezes.

Não precisávamos nos preocupar, não havia desentendimento algum. Eu aproveitava os momentos em que me sentia como alvo de toda sua atenção. Talvez a preocupação dela não tenha permitido que notasse a minha egoísta satisfação!

Quando as pernas dela estavam já doloridas, dei a última instrução: Entre à direita. Ela parou o carro vermelho depois de um percurso sem falhas apesar da curta experiência anterior. Descemos do automóvel e dei a ela os parabéns junto a um apaixonado beijo cheio de orgulho. A gente é que sabe, pequena.